SOLO

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Houve um tempo em que almoçar sozinha era um pesadelo. Ficar sozinha no intervalo da escola, então, deus me livre - apesar de acontecer poucas vezes, porque meus amigos sempre estavam lá, era uma ameaça constante que me dava calafrios. Sair pra tomar um sorvete, ir ao médico, fazer uma caminhada eram atividades que pediam muito mais de mim se feitas all by myself. Eu murchava quando a amiga ligava e do outro lado da linha soltava um "não vou conseguir, você vai ter que ir sozinha". E se rirem de mim? Oh, pobrezinha - não tem um único amigo ou namorado pra acompanhá-la. Naquela época, eu pensava que todos iriam observar meu jeito desastrado de fazer as coisas, espreitando em busca das minhas falhas pra apontá-las e rir das mesmas.

Hoje, graças ao bom senso que iluminou essa cabecinha, penso diferente. Digo sem vergonha alguma, e até uma pontinha de orgulho do meu crescimento, que sou uma pessoa que precisa respirar. A necessidade de um tempinho só pra mim e do meu espaço se faz presente todos os dias. E não falo só em níveis de relações amorosas sufocantes ou amizades possessivas, mas também em proporções faraônicas que a semântica do "estar sozinha" pode tomar. Sair desacompanhada, tomar decisões importantes por conta própria, resolver os perrengues no modo solo da coisa significam que eu conquisto, cada vez mais, a confiança que preciso depositar em mim mesma antes de dar algum passo pra mudanças na minha vida. É através das pequenas ações, dos pequenos desafios do dia a dia, que tenho orgulho de quem venho me tornando. A independência é, sem dúvida, um estado de espírito libertador e reconfortante.

Do alto dos meus 18, posso dizer que entendi que o principal é se dar bem consigo mesma, estar bem com quem você é e se perdoar mais. É uma batalha diária que a gente trava consigo mesma, e só vence quando se isola do barulho lá fora, da bagunça do mundo, e olha pra dentro. E pra fazer isso, não podemos deixar de cuidar dos nossos sentimentos e ignorar os sinais que o corpo e o coração nos dão. Afinal, sem perceber, são poucos os momentos em que nos vemos realmente sozinhos no dia a dia - estamos sempre cercados de pessoas, sejam elas amigas ou não. Por isso fica difícil cair em si mesmo, prestar atenção em nós mesmos, ouvir o que nosso silêncio tem a dizer.

Às vezes, é necessário se fazer coadjuvante na vida dos outros, para assumir o papel de protagonista da nossa própria vida. Pra manter a (in)sanidade mental, o riso leve e o coração mais feliz. 

Passamos muito tempo dando voltas e voltas tentando acertar com os outros. Dizer a coisa certa, cozinhar o prato preferido do outro, aconselhar o outro... e isso não é ruim. Mas ninguém sobrevive nesse mundo sem equlíbrio. Se não fizermos para nós mesmos o que fazemos para os outros, deixamos de cuidar de quem mais importa. É o clichê mais verdadeiro de todos os tempos: pra cuidar dos outros, você precisa cuidar de você primeiro. 


Então, você tem cuidado de você mesmo?
Tem assistindo os filmes que você gosta?
Tem reservado um tempinho do seu dia só pra você?
Tem descoberto músicas novas? 
Tem observado as fachadas dos prédios lindos que fazem parte do seu trajeto, assim, sem pretensão?
E você tem sentido o cheiro de primavera que a cada dia fica mais presente? Tem comprado flores pra você mesmo? E cozinhado o seu prato preferido? Hein?
Me diga, por favor, que você não tem engolido seu choro. E que tem dançado enquanto ninguém olha, acendido seus incensos e falado um pouco sozinho, porque enlouquecer de vez em quando nos impede de enlouquecer de vez.



Precisamos de certa paz e certa tranquilidade que talvez só uma caminhada pelo centro da cidade, sentindo o vento no rosto, possa proporcionar. Ou um chá das 17h  no seu café preferido, com sua torta preferida, só você e a trilha sonora do local. Back to basics. Essa é a essência: a busca por uma vida mais leve, mais gostosa de se viver, com mais calma, mais coisas a ver com a gente e com a liberdade de ir sozinho e gostar disso.



À medida em que percebemos essas mudanças que passamos, vamos nos reafirmando como nós mesmos. Lapidamos a personalidade, descobrimos nosso valor, percebemos que somos especiais - não para outras pessoas, mas para nós mesmos. A gente aprende a perdoar nossos errinhos, a conviver melhor com o que vemos no espelho. E isso faz com que ficar a sós, acompanhados apenas de nós mesmos, se torne uma coisa boa. Como uma grande cortina aveludada que se abre pra um novo mundo, uma nova percepção sobre as coisas do cotidiano.

O silêncio pode ser uma proclamação de felicidade. Por essas e outras já dizia John Mayer: don't be scared to walk alone, don't be scared to like it. 


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2 comentários

  1. Passei aqui só pra dizer: obrigada por falar o que eu precisava 'ouvir'! Seu blog tá lindo.
    Beijão!

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  2. Este comentário foi removido pelo autor.

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